"Viver a 4500 metros
acima do nível do mar não é precisamente o que está projectado para o corpo
humano. A esta altitude, a pressão do oxigénio é tão baixa que a quantidade que
chega aos pulmões não é suficiente para o organismo, excepto para aqueles que
estão habituados a esse ambiente.
Há vários povos que vivem em
regiões de grande altitude, como os andinos ou as tribos das montanhas etíopes.
Os habitantes do planalto tibetano têm traços fisiológicos únicos, resultado de
séculos de evolução a viver em condições extremas.
Para além de não
sofrerem as alterações fisiológicas que qualquer outro ser humano tem de passar
para ambientar-se a alturas elevadas, o sangue deste povo contém menos
oxigénio, menos hemoglobina e uma quantidade normal de glóbulos vermelhos.
Como resultado da
adaptação do organismo à região, os tibetanos não demonstram vasoconstrição
pulmonar com a falta de oxigénio e mantêm um metabolismo aeróbio normal. ...
A única explicação
possível para esta adaptação genuína esconde-se nos genes, garante um estudo,
realizado por investigadores das Universidade de Utah (nos Estados Unidos) e de
Qinghai (na China), publicado na Science. ... “O que é único nos
tibetanos é que desenvolveram mais glóbulos vermelhos”, explica Josef Prchal,
professor de Medicina Interna da mesma universidade americana, que acrescenta:
“Se formos capazes de entender como isto se processa, podemos desenvolver
tratamentos para algumas doenças”, como o edema pulmonar e cerebral ou os
distúrbios relacionados com a falta de oxigénio. " (http://www.cienciahoje.pt/index.php?oid=42598&op=all)
A teoria de Selecção
Natural de Darwin e a Genética, dois componentes da Teoria Neo-Darwinista,
conseguem explicar quase todos os fenómenos de evolução de seres vivos. A
evolução é sempre uma série de modificação que permitem ao organismo melhor
adaptar-se ao meio ambiente. Deste modo, uma célula procariótica transformou-se
em eucariótica com mitocôndrias e cloroplastos para se adaptar melhor ao meio
hostil. Esta transformação ocorre devido às mutações que ocorrem no material
genético de um ser vivo, no DNA que determina as suas características
fenotípicas. As mutações ocorrem em vários segmentos do genoma, muitas vezes
são prejudiciais a saúde humana, provocando doenças genéticas como o cancro, a
anemia falciforme, talassemia, hemofilia, nanismo, entre as outras. Porém, algumas
mutações fornecem aos seus portadores características benéficas que os permitem
adaptar-se melhor ao meio e ter maior número de descendentes propagando os seus
genes no pool genético de uma
população. Os indivíduos mais aptos sobrevivem e os menos aptos são eliminados.
As mutações, mesmo
aquelas que são aparentemente prejudiciais, fornecem aos seus portadores
benefícios. Por exemplo, a talassemia que é comum na região do Mediterrâneo,
quando em indivíduos heterozigóticos fornecem-nos a resistência a malária. O
mesmo acontece em algumas regiões da África, onde se regista uma grande
incidência de malária, os indivíduos com anemia falciforme, quando são
hetorozigóticos, não sofre de deficiências graves e são imunes a malária. Este
fenómeno é conhecido como a resistência dos hererozigóticos. De mesma forma, os
portadores de gene da doença de Tay-Sachs, que teve origem numa comunidade de
judeus, embora mortal em homozigotia, torna os heterozigóticos resistentes a
tuberculose. Os indivíduos portadores de um alelo que provoca nanismo ficam
prevenidos de cancro e diabetes.
O meio ambiente
beneficia os indivíduos com determinadas características, deste modo os
indivíduos que vivem em altitudes elevadas estão adoptados às baixas pressões
de oxigénio. As suas características genéticas compensam a falta de oxigénio
com um maior número de hemácias no sangue. Possivelmente, no inicia a população
tibetana teria as mesmas características que a população chinesa, só que o
ambiente da montanhas provocou a selecção natural: os indivíduos com baixo
número de hemácias eram eliminados e os com maior quantidade de glóbulos
brancos deixavam descendência e propagavam os seus genes no fundo genético da
população tibetana. Sabe-se que as mulheres tibetanas estão adaptadas a
gestação do feto a uma altitude elevada, quase 5 mil metros acima do nível
médio do mar. Os europeus que chegaram a Tibete verificaram que quase todos os
bebés de mulheres não tibetanas nasciam mortos devido a falta de oxigénio.
Assim, só os portadores de genes mais benéficos para a adaptação a altitude
elevada deixavam descendência.
Muitas vezes, as
populações isoladas apresentam características únicas devido ao isolamento
geográfico, que não permite o contacto e cruzamento com outros indivíduos, e o
chamado efeito Fundador, que restringe a variedade genética da população
original. Como o exemplo, os aborígenes da Austrália não possuem o
aglutinogénio B nas suas hemácias, logo, o grupo sanguíneo B é inexistente
nesta população. Possivelmente, o grupo de indivíduos que povoou o território australiano
há milhares de anos não tinha indivíduos com aglutinogénio do tipo B ou a
mutação que originou os aglutinogénios do tipo B ocorreu posteriormente na
população euro-asiática.
Pode também acontecer
que os indivíduos portadores de algumas características sejam extintos devido a
uma catástrofe natural ou uma epidemia, sendo os seus genes eliminados do fundo
genético da população – o efeito Gargalo.
A espécie humana
apresenta uma grande variedade genética, pois encontra-se espalhada pelo todo o
planeta Terra. Esta variedade genética não se traduz só na cor do cabelo ou dos
olhos, está relacionada com as características que influenciam a nossa
adaptação a um determinado ambiente, como a capacidade de produzir mais ou
menos melanina na pele, uma maior produção de glóbulos vermelhos, maior força
ou resistência física. Todas estas características estão guardadas no nosso pool genético e constituem o “seguro de
vida” da nossa espécie – no caso de alterações bruscas no meio ambiente, alguns
de nós estarão certamente mais aptos para sobreviver, melhor adaptados. A
adaptação do ser humano a vários tipos de ambiente, até aos mais hostis, como é
o caso dos tibetanos, constitui uma das maiores provas de que a nossa espécie
tem futuro neste planeta.
Belerofonte (Pseudónimo)